sexta-feira, 5 de julho de 2013

A FARSA DE PORTAS E PASSOS


A farsa de Portas e Passos

 O ‘briefing' é mais ou menos este: Paulo Portas zanga-se com o parceiro de coligação e anuncia que vai sair do Governo.

O ‘briefing' é mais ou menos este: Paulo Portas zanga-se com o parceiro de coligação e anuncia que vai sair do Governo. Passos Coelho faz birra, recusa o pedido e garante que, mesmo sozinho, fica em São Bento. Dois ministros do CDS seguem as pisadas d...
o líder, pedem demissão e o país fica suspenso por uma comunicação de Portas que, afinal, não acontece. Ao mesmo tempo, a comissão executiva dos centristas reúne-se no quartel-general para avaliar os estragos das últimas horas e descobrir uma saída de emergência airosa e responsável. Decidem que afinal, a coligação se pode renegociar, que será o mesmo Portas a fazê-lo com Passos e que, afinal, os seus ministros se mantêm ministros como antes. Enquanto isso, no mundo que continua a acontecer do lado de fora, os juros da dívida disparam como foguetes, as cotações das empresas caem para níveis rasteiros, as cotadas perdem milhões e os investidores pensam duas vezes antes de investir os seus em Portugal, a perplexa imprensa internacional, dos Estados Unidos à Alemanha, trata a crise política portuguesa com sarcasmo e cola o país de novo ao que a Grécia tem de pior, o Parlamento adia trabalhos e decisões e o país inteiro pára, entalado entre o pasmo e a indignação, a ver o trabalho dos últimos dois anos a arder em meia dúzia de horas.


Isto era assim até ontem. Mas nada nem ninguém garante que será a mesma coisa hoje. Estamos no país onde o que ontem era uma decisão ‘irrevogável', hoje pode ser uma opção ‘improvável'. Onde quem ontem era um parceiro, hoje pode ser um traidor. Onde o que ontem era palavra de honra, hoje não passa de uma mentira. Mas esse risco existe - basta ver a decisão de ontem do CDS. Mandatar Paulo Portas para negociar com o primeiro-ministro as condições em que a coligação se pode manter, é mais ou menos o mesmo que pedir a um incendiário que, depois de pegar fogo à floresta e ficar a vê-la arder, regresse ao local do crime com uma caixa de fósforos e um bidão de gasolina nas mãos. Alguém confia que vai correr bem?


Chamar a isto estratégia política não é brincar com o fogo. É brincar com os portugueses e com as suas vidas que, à conta de birras privadas e vaidades políticas, estão a ser atiradas à fogueira. Mas é também expor a verdadeira natureza insensata, irresponsável e indigna de muitos dos nossos políticos. A mesma natureza que, ironicamente, não parece ter mudado nada em quase 150 anos. "Em Portugal não há ciência de governar nem há ciência de organizar oposição", já escrevia Eça de Queirós em 1867. "Falta a aptidão e o engenho e o bom senso e a moralidade, nestes dois factos que constituem o movimento político das nações. A ciência de governar é neste país uma habilidade, uma rotina de acaso, diversamente influenciada pela paixão, inveja, intriga, vaidade, frivolidade e interesse." Mas a refrega é dura: "combate-se, atraiçoa-se, brada-se, foge-se, destrói-se, corrompe-se." Sim, a descrição parece familiar. Não admira, por isso, que acabemos a ler pérolas como as que nos dizem que "estamos num estado comparável à Grécia: mesma pobreza, mesma indignidade política, mesmo abaixamento dos caracteres, mesma ladroagem pública, mesma agiotagem, mesma decadência de espírito, mesma administração grotesca de desleixo e de confusão". Podia ser uma notícia de ontem, mas não: foi escrita pelo mesmo Eça, em 1872. O que prova que não aprendemos nada com a história e os erros. Mas hoje podia ser um bom dia para largar as habilidades políticas e começar a levar o país e a sua governação a sério. Ou é preciso fazer um ‘briefing' aos senhores governantes?

Helena Cristina Coelho

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