CRISE NO PS - "OU COSTA OU NADA", ESCREVE CLARA FERREIRA ALVES, NO EXPRESSO
Por Clara Ferreira Alves
OU COSTA OU NADAJornal Expresso SEMANÁRIO #2170, 31 de Maio de 2014
A partir do momento em que declarou a sua candidatura à liderança, os ataques começaram
Sempre que falo com alguém do Partido Socialista (e refiro-me a quadros políticos importantes, históricos ou não, retirados ou não) ouço queixas de Seguro. Seguro é isto, Seguro é aquilo. Mais do que ser isto ou aquilo, o que se diz à boca pequena é o que Seguro não é. A evidência da ausência de um chefe de um grande partido. Mas o que ele é também é importante. Alguém que blindou o partido para não ser ameaçado, alguém que é exímio a convencer e comprar clientelas, alguém que lidera sobre a fraqueza e o vazio deixados por Sócrates. Alguém que construiu uma muralha burocrática e clientelista para impedir qualquer adversário de o destronar. Só uma vez, uma única, nessas múltiplas e variadas conversas, me apareceu uma pessoa que disse: olhe que o Seguro não é assim tão mau como você diz! “Não é assim tão mau.” Nunca ouvi um elogio ao saber, ao poder, à convicção, à inteligência política de António José Seguro. Como pessoa, Seguro não me interessa e sobre a pessoa nada tenho a dizer. Falo, exclusivamente, do político. E do secretário-geral do PS que na noite das eleições europeias e depois de uma votação anémica que era um ato de censura dos eleitores gritou que tinha tido uma vitória estrondosa. Há um limite para a tolice em política.
Era lamentável que os mesmos que atacavam Seguro em privado não o fizessem dentro do partido, e não me refiro aqui a António Costa, com quem nunca falei de Seguro. Falo dos outros, os desiludidos, os que afirmavam que Passos Coelho era preferível a Seguro em 2015, os que garantiam que jamais votariam em Seguro e não tinham votado em Seguro. O recuo de António Costa antes das autárquicas foi, para dizer o mínimo sobre o episódio, um desapontamento socialista e nacional. Pode ser que o risco de perder a Câmara e o partido fossem riscos a mais, pode ser que Costa seja melhor estratego do que tático e saiba esperar, coisa que o mediatismo da política pune injustamente. Pode ser, enfim, que Costa tivesse razão.
Depois dos resultados de domingo, é claríssimo o que o país e os eleitores pensam de Seguro, que não coincide com o que ele pensa sobre ele mesmo. Seguro perdeu as eleições, leia-se bem, perdeu as eleições. Para o PSD e o CDS, este foi o melhor resultado possível. Uma derrota por pequena margem, ao cabo de três anos de duríssima austeridade, escândalos, medidas impopulares, frases infelizes e ultimatos ao povo português. Para a coligação, Seguro em 2015 era um seguro de vida, e por isso Seguro e Assis foram sempre tão elogiados como opositores “civilizados”. Para demonstrar que não eram, os dois usaram e abusaram de uma retórica demagógica, prometendo o que não podem nem poderiam dar. Uma vida longe da austeridade ou um regresso ao passado.
O anúncio de António Costa foi a única boa notícia da semana. Poupa-nos o espetáculo de uma coligação entre fracos em 2015 e poupa-nos o amadorismo num ponto da História em que Portugal não se pode dar ao luxo de contratar amadores. António Costa é um político experiente, um hábil negociador, um conhecedor da Administração Pública, um político com convicções e passado, uma história dentro do PS. É, tem sido, um excelente presidente da Câmara, onde se aprende verdadeiramente a governar. Será o melhor candidato socialista para 2015, dando ao partido, pelo menos, a possibilidade de uma maioria absoluta. É claro que a partir do momento em que declarou a sua candidatura à liderança, os ataques começaram. E a campanha suja começará dentro de momentos. Já vejo os títulos, as mexidas no caixote de lixo. O PSD e o CDS vão acusá-lo de esquerdismo insano e insanável, que destruirá o país se ganhar. E de “socratismo”, pecado mortal. O PSD vai querer a Câmara. E a esquerda, sempre atenta ao desvio, vai acusá-lo de não ser suficientemente de esquerda e de fazer acordos com a direita. Costa anda nisto há tempo suficiente para saber que será assim. O maior inimigo de Costa está dentro do partido. Seguro, um Rastignac da política, e os seus correligionários, que não querem perder a face e a parcela de poder, montarão uma barreira à entrada dele na arena. Vai valer tudo, incluindo a acusação de que Costa fragilizou o PS com esta decisão, e as acusações habituais de golpismo que os jornalistas, exaurido que está o potencial dramático do PSD e do CDS, explorarão à exaustão e à cata de manchetes. Costa vai estar no centro de uma disputa pelo espaço mediático entre jornais, televisões e internet. Vai ser o isco e o protagonista de um drama que o transcende, a agonia dos media tradicionais.
Esta é a última oportunidade que o Partido Socialista tem para demonstrar que pode governar Portugal melhor do que o PSD, mesmo que venha a acordar pontos essenciais com o PSD. Esta é uma oportunidade para a social-democracia na Europa. Ou Costa ou nada.
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