ESTAMOS TRAMADOS
OS COBRADORES SEM FRAQUE
Troika reestrutura Portugal de alto a baixo
Medidas mais amplas do que na Grécia e Irlanda
Justiça obrigada a fazer reformas profundas
Ministério das Finanças é todo reorganizado
Corte no subsídio de Natal ainda por decidir
BCE quer impor reforço do capital da banca
Troika estranha afastamento de min. Finanças
INE foi obrigado a aceitar défice de 2010
Troika O pacote de medidas está praticamente concluído e o acordo político é para a semana. O FMI e a Europa preparam-se para exigir uma reformulação total da organização do Estado português
Programa para Portugal é mais vasto do que o da Grécia e Irlanda
Textos de RICARDO COSTA
O pacote de medidas que a troika do FMI, Banco Central Europeu e Comissão Europeia têm praticamente pronto e que será conhecido nos próximos dias é altamente detalhado e inclui datas precisas de aplicação de todas as medidas, apurou o Expresso junto de fonte da troika. O conjunto de medidas vai ser mais vasto do que noutros países que tiveram intervenções, como a Grécia e a Irlanda. A explicação é simples: o principal problema português é a falta de competitividade da economia e isso só se resolve com reformas estruturais no Estado e na economia.
Reformas laborais profundas, várias medidas fiscais, reforço de capitais da banca, reforma do sector dos transportes, reestruturação da administração pública, reforma total da justiça, melhoria dos mecanismos de concorrência, (quase) nada fica de fora. De tal forma é uma “auditoria completa” o que os mais de 50 elementos da troika estão a fazer, que entre as medidas previstas está, por exemplo, uma reforma profunda do funcionamento do Ministério das Finanças. O objetivo é permitir que o controlo sobre os restantes departamentos do Estado seja real e efetivo.
Em suma, as medidas a aplicar em troca do pacote de ajuda são uma verdadeira reestruturação do Estado, com o objetivo de permitir que Portugal ultrapasse a recessão e consolide as contas públicas em simultâneo.
Um dado muito significativo quanto à amplitude do pacote é o facto de a troika querer mexer no sector da justiça, nomeadamente na ação executiva, que literalmente entope os tribunais nacionais. Grande parte (70%) dos 1,6 milhões de casos que estavam pendentes em 2010 nos tribunais de primeira instância (um aumento de 4% em relação ao ano anterior) são ações executivas, sobretudo processos cíveis de cobrança de dívidas e penhoras com prazos considerados inaceitáveis pelas entidades internacionais. A intervenção na justiça é delicada porque entra claramente em confronto com ideias que os partidos e os vários governos têm tido no sector. E é natural que venha ter a oposição das várias corporações desta área.
Medidas económicas
As mexidas no mercado de trabalho são certas. Apesar de o Governo se ter mostrado apenas disponível para mexer no subsídio de desemprego no sentido de reduzir a sua duração, a troika não abdica de alterações muito mais profundas. As medidas vão tornar mais flexíveis as contratações e os despedimentos, indo muito mais longe do que tem sido discutido em sede de concertação social. Um exemplo é o contrato único de trabalho, cuja introdução levaria à extinção do contrato coletivo, com o objetivo de criar maior abertura para acabar com os recibos verdes e os contratos a prazo.
Mexer a fundo na concorrência, nomeadamente nas empresas que operam em bens transacionáveis e em sectores que por vezes são monopólios naturais, é outro dos objetivos da troika. Sectores como a energia, gás e telecomunicações podem ser afetados. Há várias hipóteses em perspetiva para intervir a este nível. Uma delas é aumentar o IVA sobre alguns produtos, impedindo as empresas de o repercutir nos preços ao consumidor. O outro é criar uma tributação especial para lucros acima de um valor determinado.
Subsídios ainda por decidir
A subida do IVA é mesmo inevitável mas nada está ainda fechado quanto à eliminação total ou parcial dos subsídios de Natal e férias (ou o seu pagamento em títulos de dívida pública). As negociações ainda decorrem para que se encontrem medidas com efeito semelhante. Estas medidas foram aplicadas noutros países por terem efeito imediatos, mas quer o FMI quer a Comissão Europeia estão particularmente atentos aos efeitos colaterais que podem ter na economia.
Onde a troika não cede é nas privatizações. A lista que o Governo tinha feito para o atual Orçamento do Estado já era ambiciosa, mas esta vai bem mais longe e implica uma alteração substancial do papel do Estado na economia.
O pacote total, que deverá rondar os 80 mil milhões de euros, deverá ser utilizado em três frentes: financiar o Estado, sanear as empresas públicas e criar um fundo para recapitalizar a banca em caso de necessidade (ver página 6).
Prazos dilatados
A alteração do défice orçamental de 2010 de 8,6% para 9,1, anunciado há uma semana, foi outro dos pontos complexos da negociação, com o INE muito renitente em aceitá-la. Ao que o Expresso apurou, só depois da ameaça de colocar as contas portuguesas sob “reserva geral” é que o INE cedeu. Mas neste campo a pressão parece diminuir. A flexibilização das metas orçamentais é um ponto em que FMI e Comissão Europeia coincidem. Quer a meta do défice deste ano (originalmente de 4,6%) quer o objetivo dos 3% podem ser dilatados no tempo para evitar uma recessão profunda. Os técnicos do Banco Central Europeu são quem tem mais dúvidas neste ponto. Depois de tudo isto, ainda falta o acordo com Governo e partidos, uma questão a que a troika dá atenção, por causa do período eleitoral, mas que de modo geral é dado como adquirido, seja qual for a forma. A ideia de convocar a Comissão Permanente da AR parece estar fora de causa, mas uma “carta de conforto” com um compromisso dos líderes partidários é quase inevitável.
rcosta@expresso.impresa.pt
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