HÁ UMA JUSTIÇA PARA OS JARDINS GONÇALVES, E DEPOIS HÁ UMA JUSTIÇA PARA O MEU PAI
por Henrique Raposo
em www.expresso.sapo.PT
HÁ UMA JUSTIÇA PARA OS JARDINS GONÇALVES, E DEPOIS HÁ UMA JUSTIÇA PARA O MEU PAI
"Os caloteiros que enganaram o meu velho e a justiça continuam a viver à grande; os Rendeiros e os Oliveiras e Costa nem sequer são julgados"
"Os caloteiros que enganaram o meu velho e a justiça continuam a viver à grande; os Rendeiros e os Oliveiras e Costa nem sequer são julgados"
Como tantos outros empresários, ou ex-empresários, o meu velho perdeu tudo no ano passado. A empresa que levantou do chão após a crise de 1975-85 não resistiu a este ciclone. Há drama, mas não há lamechice. A vidinha dá e tira.
Estar aqui, na economia real, é mesmo assim. O problema, portanto, não está na falência em si mesmo, mas na forma como tudo ocorreu.
É que o meu velho foi à falência tendo milhares e milhares de euros empatados nos tribunais. Durante anos e anos, os juízes da pátria foram incapazes de apertar os caloteiros que deviam dinheiro à empresa do Sôr Raposo. E agora imaginem a angústia, imaginem que têm uma empresa em declínio, com cada vez menos clientes, com dificuldades para pagar salários e, ao mesmo tempo, imaginem que estão sentados num baú cheio de euros que não podem abrir devido à incompetência do estado de direito.
Conseguem imaginar? Um sujeito dá em louco, fica resvés Campo de Ourique com instintos revolucionários. Não brinco.
Aos 60, Raposo sénior voltou à condição de mero trabalhador. Mas, repito, o problema não é esse. O problema não está no bolso, mas na sensação absurda de iniquidade moral, o travo amoral: a justiça que levou o meu pai à falência é a mesma justiça que é incapaz de julgar os Rendeiros, os Jardins Gonçalves, os Oliveiras e Costa. Mais uma vez, percebemos que o estado de direito é incapaz de punir quem não joga dentro das regras.
Os caloteiros que enganaram o meu velho e a justiça continuam a viver à grande; os Rendeiros e os Oliveiras e Costa nem sequer são julgados, nem sequer pagam aquelas multas de milhões. Não brinco: isto coloca um tipo à beirinha de instintos, digamos, pouco constitucionais. Se as leis não são aplicadas, votar serve exactamente para quê?
O grande veneno de uma sociedade não é a desigualdade económica. O Sôr Raposo não fica furioso quando vê os magnatas com Aston Martins e pegas checas. Isso são penears, para citar o mister.
O veneno está, isso sim, na desigualdade legal, está na percepção de que existem tipos que estão acima do bem e do mal. O veneno não é a assimetria de rendimento, é a assimetria da impunidade. O vírus não é a falta de dinheiro, é a falta de respeito. Respect is the ultimate currency, diz a personagem deste filme de Spike Lee. Tem toda a razão.
No ano da graça de dois mil e catorze, a grande crise de Portugal é a crise do desrespeito legal. Existe uma justiça para ricos e uma justiça para os Sôr Raposo da pátria. Estas pessoas jogam pelas regras mas são punidas e, quando olham para o lado, vêem hooligans que continuam a jogar. Não brinco: isto coloca um tipo à beira de instintos pouco católicos.
Estar aqui, na economia real, é mesmo assim. O problema, portanto, não está na falência em si mesmo, mas na forma como tudo ocorreu.
É que o meu velho foi à falência tendo milhares e milhares de euros empatados nos tribunais. Durante anos e anos, os juízes da pátria foram incapazes de apertar os caloteiros que deviam dinheiro à empresa do Sôr Raposo. E agora imaginem a angústia, imaginem que têm uma empresa em declínio, com cada vez menos clientes, com dificuldades para pagar salários e, ao mesmo tempo, imaginem que estão sentados num baú cheio de euros que não podem abrir devido à incompetência do estado de direito.
Conseguem imaginar? Um sujeito dá em louco, fica resvés Campo de Ourique com instintos revolucionários. Não brinco.
Aos 60, Raposo sénior voltou à condição de mero trabalhador. Mas, repito, o problema não é esse. O problema não está no bolso, mas na sensação absurda de iniquidade moral, o travo amoral: a justiça que levou o meu pai à falência é a mesma justiça que é incapaz de julgar os Rendeiros, os Jardins Gonçalves, os Oliveiras e Costa. Mais uma vez, percebemos que o estado de direito é incapaz de punir quem não joga dentro das regras.
Os caloteiros que enganaram o meu velho e a justiça continuam a viver à grande; os Rendeiros e os Oliveiras e Costa nem sequer são julgados, nem sequer pagam aquelas multas de milhões. Não brinco: isto coloca um tipo à beirinha de instintos, digamos, pouco constitucionais. Se as leis não são aplicadas, votar serve exactamente para quê?
O grande veneno de uma sociedade não é a desigualdade económica. O Sôr Raposo não fica furioso quando vê os magnatas com Aston Martins e pegas checas. Isso são penears, para citar o mister.
O veneno está, isso sim, na desigualdade legal, está na percepção de que existem tipos que estão acima do bem e do mal. O veneno não é a assimetria de rendimento, é a assimetria da impunidade. O vírus não é a falta de dinheiro, é a falta de respeito. Respect is the ultimate currency, diz a personagem deste filme de Spike Lee. Tem toda a razão.
No ano da graça de dois mil e catorze, a grande crise de Portugal é a crise do desrespeito legal. Existe uma justiça para ricos e uma justiça para os Sôr Raposo da pátria. Estas pessoas jogam pelas regras mas são punidas e, quando olham para o lado, vêem hooligans que continuam a jogar. Não brinco: isto coloca um tipo à beira de instintos pouco católicos.
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