sexta-feira, 23 de agosto de 2013

AUTÁRQUICAS 2013 - TENHAM VERGONHA!

                                                    
                                              Leonel Moura/Jornal de Negócios)

Estes homens não têm ética e demonstram estar dispostos a tudo. Mesmo a ilegalidades. Se o fazem numa questão tão transparente, o que não farão no exercício do poder, mais opaco? Não merecem confiança e deviam ser banidos da política.
Nada pior do que transformar um vício num modo de vida. Sucede na droga ou na corrupção. Aquilo que começa por ser experimentalismo ou oportunismo depressa deriva numa existência sórdida não raras vezes criminosa. Sucede também na política. Quando o serviço público democrático, por natureza temporário, se torna num meio de subsistência e numa verdadeira profissão para a vida.

Por estes dias temos o caso dos candidatos autarcas que excederam o limite dos mandatos e mesmo assim insistem em se recandidatarem. Ao contrário de outras, a lei é curta, clara e objetiva: "O presidente da câmara municipal e o presidente da junta de freguesia, (…) não podem assumir aquelas funções durante o quadriénio imediatamente subsequente ao último mandato consecutivo permitido". Ou seja, essa pessoa não pode voltar a assumir a função de presidente da câmara ou de presidente da junta de freguesia. Independentemente se o faz numa ou noutra localidade. Como não podia deixar de ser, a questão não é territorial mas de função.

Ao contrário do que por aí se diz para tentar deitar areia para os olhos, a lei está bastante bem feita. Basta ler, coisa que poucos fizeram. Mais do que lançar suspeitas sobre a natureza potencialmente corrupta deste tipo de cargos, visa permitir uma maior participação cívica e política. Não é portanto porque o cargo pode gerar cumplicidades locais e estimular o compadrio. O objetivo é mais nobre. Visa dar oportunidade a outros e garantir maior diversidade, pois esse é o princípio fundamental do sistema democrático. Ninguém é Presidente da Câmara, mas está Presidente da Câmara. E essa condição deve ser temporária.

Sucede que existem políticos que não pensam na democracia mas só nos seus próprios interesses. Políticos que não sabem fazer mais nada e que assumem a sua atividade, não como um contributo para o bem social, mas como um modo de vida que lhes garante poder, salário e benesses de toda ordem. Por isso usam e abusam de todos os estratagemas para se manterem nos cargos.

A questão é cristalina. Trata-se de uma perversão da lei, para além de uma flagrante falta de decência. Estes homens não têm ética e demonstram estar dispostos a tudo. Mesmo a ilegalidades. Se o fazem numa questão tão transparente, o que não farão no exercício do poder, mais opaco? Não merecem confiança e deviam ser banidos da política.

Infelizmente esta é uma daquelas histórias, ao estilo dos filmes negros, em que praticamente só existem maus. Os partidos, PSD, CDS e PC, apoiam esta vergonha, o PS, como sempre, hesita e só o Bloco de Esquerda mantém a coerência. Quanto ao resto há para todos os gostos. Juízes decidem para um lado ora para outro, jornalistas e comentadores idem.

A decisão final cabe contudo ao Tribunal Constitucional. E aí o caso é mais sério. Desde logo porque a decisão já devia estar tomada. Perante uma trapalhada que afeta o funcionamento da própria democracia, o Tribunal devia ter assumido a sua responsabilidade de clarificação. Sem esperar por formalismos.

Por outro lado, é de temer que estes juízes apreciem detalhes mas não o essencial. O próprio Presidente da República, sempre esperto quando se trata de defender o seu partido, lançou a confusão com a pretensa troca de um "da" por um "de", como se isso tivesse algum significado. Os políticos, finórios, agarram-se sempre a vírgulas para justificar o injustificável. Ora não é a língua portuguesa que está em julgamento, mas a própria essência da democracia. O Tribunal Constitucional vai decidir se considera que a democracia assenta num regime de mandatos temporários ou se permite uma eternização das funções eletivas. Se isso acontecer Portugal deixa de ser uma democracia para se tornar numa forma de oligarquia. Pelo menos a nível local.

Esta história vem, mais uma vez, patentear a decadência da política e a falta de seriedade na gestão da coisa pública. Depois admirem-se se as pessoas deixem de votar e participar, insultem os dirigentes e assumam o vale tudo como conduta aceitável e até aconselhável. Os maus exemplos vêm sempre de cima.

0 Comentários:

Enviar um comentário

Subscrever Enviar feedback [Atom]

<< Página inicial