ÍDOLOS - HOSPEDEIROS DAS NOSSAS ÂNSIAS DE GLÓRIA
PANTEÕES
Por Luís Rainha/publicado em 8 Jan 2014 - Jornal i
Os ídolos têm um ciclo de vida complexo: primeiro, usurpam o corpo de pessoas a quem decidimos, pela sua beleza, pelas suas vitórias, por cem outras razões, emprestar parte substancial da nossa atenção e dos nossos afectos.
Neste estado larvar, o ídolo é puro veículo para as almas insatisfeitas dos fãs; vivemos através dele vidas mais reais e emoções mais fortes do que as dos dias cinzentos que nos calharam em sorte.
Se, por desgraçada conjunção cósmica, toda uma nação se vê atolada num pântano de tristeza, a fome de felicidade de milhões foca-se no indivíduo que brilha como se fosse (embora não seja, ninguém o pode ser) capaz de lhes trazer a todos, a cada um deles, redenção da dor, talvez imaginada, que sofrem como míngua de sentido nos seus destinos.
Mas a inveja é uma paixão periclitante. Quando o ídolo mostra vontade própria e resolve afastar-se da perfeição que lhe sonhámos, desilude-nos ao revelar-se apenas humano: afinal droga-se, ou bate na mulher, ou é batoteiro. Então, comprazemo-nos a procurar provas do escândalo, a amplificá-lo pelo boato. E partimos em busca de novo hospedeiro para as nossas ânsias de glória.
Por fim, o ídolo morre. Da sua crisálida emerge o rei, o mito, o deus, sempre maiusculizado e eterno. O ás da Fórmula 1, o futebolista de génio, o músico desregrado, todos ascendem a um Olimpo sem defeitos onde também viverá, por procuração, um pouco de nós. Fomos heróicos e rancorosos através deles. Agora, seremos imortais.
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