HOJE. DERRUBO GRADES, AMANHÃ DEFENDO-AS
Opinião
Hoje, derrubo grades, amanhã defendo-as
por Ferreira Fernandes
Não
gostei de ver os polícias a subir, como invasores, as escadarias da Assembleia
da República. Não gosto de ver invasões da Assembleia da República, mesmo que
só sob a forma de ameaça. As forças de segurança têm razões de protesto como a
maioria dos outros portugueses. Mas não têm as mesmas possibilidades de exercer
o direito a esse protesto. Há coisas que uns têm e outros não têm, e isso é
assim não só por causa da injustiça com que o mundo está desorganizado; é
também assim por causa de como o mundo tem, e tem mesmo, de ser organizado. Já
é altura de todos entendermos esse relativismo. Os homens do lixo podem fazer
uma greve total durante dois dias; já os médicos e os enfermeiros não podem. Os
camionistas, na estrada, podem combinar parar em todo o País às 15.35 de um
determinado dia; já os pilotos de avião, no ar, não podem. Se calhar já todos
entendemos esse relativismo, sem que nenhum grupo social se sinta desapossado
dos seus direitos. Ora os polícias, além de não poderem, como os restantes
portugueses, derrubar as grades e galgar as escadarias como se fossem tomar São
Bento, têm uma razão suplementar para não o fazer. É que, fazendo, permitem-se
aquilo que não permitiriam aos outros cidadãos fazer, quando eles, polícias,
estão a exercer a sua função profissional. Claro que deixo toda esta conversa
no pressuposto de que o Estado de direito continua vigente. Mas se estamos em
insurreição, já não está aqui quem falou.
http://www.dn.pt/inicio/opiniao/interior.aspx?content_id=3546840&seccao=Ferreira%20Fernandes&tag=Opini%E3o%20-%20Em%20Foco
Diário de Notícias 2013.11.22
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